Simone de Beauvoir afirmava que era na Arte que o Homem se ultrapassava definitivamente. Mas o que é a Arte e porque precisamos dela? Porque deve a Arte fazer parte da vida das escolas?
Primeiro, ela desempenha um papel fundamental na formação dos indivíduos e tem assumido diferentes papéis e conceções na vida das sociedades, acompanhando a história da Humanidade. Como manifestação social, ela ajuda a promover mudanças e o ser humano sempre a soube utilizar, ora para chamar a atenção e agradar, ora para chocar, criticar ou modificar padrões e comportamentos.
Através de linguagens distintas, mas universais, a Arte tem em si o poder de chegar a todos, independentemente dos padrões culturais ou dos idiomas falados. Através das suas múltiplas linguagens, passa uma mensagem a quem frui. Retrata valores culturais, crenças, hábitos e dinâmicas sociais; partilha sentimentos, inquietações, preocupações e opiniões que o espetador interpreta à luz da sua história pessoal.
Apresenta, portanto, três funções fundamentais: recriação, socialização e desenvolvimento pessoal. Se, por um lado, não tem que obedecer a quaisquer deveres, tendo como função quebrar normas e clichês, procurando novos significados, por outro orienta-nos socialmente ao fornecer informação sobre o mundo. Saber apreciá-la (e sobretudo valorizá-la) implica um elevado nível de competência estética e de motivação.
Em segundo lugar, para lá do prazer que a Arte nos pode causar, ela tem o poder de desenvolver inúmeras competências sociais, cognitivas e emocionais que contribuem para a aprendizagem, o que é especialmente relevante na infância e juventude. Aprender pela Arte ajuda as crianças a construírem o seu pensamento lógico; a desenvolverem a imaginação, a criatividade e o raciocínio; a limarem a sensibilidade; e a desenvolverem competências motoras. A vivência artística influencia o modo como aprendem, comunicam e interpretam significados quotidianos, seja na escola ou fora dela. É uma forma de explorar e transmitir novos valores, de entender as diferenças culturais e de constituir-se como expressão de cada cultura e património. Quando uma criança aprende pela Arte, ela não só desenvolve competências plásticas, musicais, teatrais ou cinematográficas, como também aprende História, Geografia, Matemática, Literatura…
Esta relação acontece porque a Arte nasce e desenvolve-se num contexto específico, num tempo e num espaço próprio que só a interdisciplinaridade pode explicar. Do mesmo modo que a dança está intimamente ligada à música que a acompanha, também a motricidade e a coordenação motora se relacionam com o desenvolvimento da destreza física das crianças. Portanto, podemos e devemos incluir a Arte no estudo de qualquer disciplina porque a educação só poderá ser de qualidade se contemplar a educação artística.
Em terceiro lugar, se é verdade que os meios de comunicação contribuem para um acesso mais universal à cultura, é também verdade que esse acesso se rege em função das leis de mercado e de consumo e os efeitos do marketing provocam uma maior habituação às manifestações de cariz mais ligeiro.
Sendo premente contrariar esta ação, a escola desempenha um papel importantíssimo para a promoção do equilíbrio e da valorização da cultura mais erudita. Como educadores, não podemos partir do pressuposto de que todas as crianças têm o mesmo acesso à cultura. Por isso, é função da escola restituir os ambientes culturais e artísticos que ficam para segundo plano e abafados pelo desenvolvimento de uma cultura de massas, assim como colmatar possíveis desigualdades sociais no acesso à cultura. É fundamental integrar as crianças em ambientes onde possam contactar regularmente com a Arte, com os seus processos e com os seus criadores, valorizando a sua educação estética e artística.
Não obstante o papel insubstituível da Arte em contexto educativo, encontramo-la, por vezes, num segundo plano, como algo ornamental. Seja por desconhecimento por parte dos docentes, seja por falta de formação ou pouco à vontade para a explorar, certo é que, à medida que se avança nos anos de escolaridade, menos contacto as crianças vão tendo com manifestações artísticas.
Que cidadãos estão as escolas a formar quando os privam do acesso à Arte e à Cultura? Deixo um apelo para que as escolas reflitam sobre esta questão e se apropriem do instrumento fundamental que é o Plano Nacional das Artes, um manifesto que abre caminho para uma relação mais íntima e profícua entre a Arte e a Educação.
Em sociedades cada vez mais tecnológicas, interculturais e até supérfluas, não fora a existência da Arte e seríamos seres incompletos e desajustados, pouco críticos e nada criativos. Crescer, aprender, amadurecer, conviver e aceitar que a Arte não é uma mera relíquia decorativa, é fundamental para que ampliemos os horizontes das crianças e dos jovens para que se possam ultrapassar definitivamente.
Todo o ser humano é criador e fruidor, mas tem que estar desperto para que possa perceber, apreciar e interpretar, criticamente, a Arte. E isso só se consegue com educação.